EM BUSCA DE UM PACTO PELA UNIVERSALIZAÇÃO EM MINAS GERAIS

ARTIGO VITOR CARVALHO QUEIROZ

Em busca de um pacto pela universalização em Minas Gerais

Os déficits no setor de saneamento básico não são apenas estatísticas frias: eles representam impactos concretos e imediatos na vida das pessoas O saneamento básico permanece como uma das políticas públicas mais atrasadas do Brasil. Os déficits no setor não são apenas estatísticas frias: eles representam impactos concretos e imediatos na vida das pessoas, refletindo-se na saúde, na educação e no meio ambiente. Crianças que adoecem pela falta de água tratada ou esgotamento sanitário adequado têm seu aprendizado comprometido; comunidades sem coleta e tratamento de esgoto convivem com rios poluídos e com a proliferação de doenças; e a sociedade, em última instância, arca com custos crescentes em saúde pública e em recuperação ambiental. Não é exagero afirmar que cada real investido em saneamento retorna múltiplos benefícios sociais, ambientais e econômicos.

O Estado tem um papel insubstituível na condução dessa política, independentemente do modelo de prestação dos serviços – seja público, privado ou híbrido. Esse papel não se limita à titularidade legal do serviço ou à propriedade de empresas estatais: trata-se de uma responsabilidade constitucional e civilizatória de assegurar que cada cidadão tenha acesso a água potável, esgotamento sanitário, manejo adequado de resíduos sólidos e das águas pluviais. O saneamento é um direito humano fundamental e um pilar para a dignidade, a cidadania e a sustentabilidade.

É inegável que Minas Gerais enfrenta uma grave crise fiscal. A necessidade de medidas para reequilibrar as contas públicas é urgente. Entretanto, qualquer debate sobre ativos estratégicos deve ir além da óptica do ajuste financeiro imediato e considerar os efeitos de curto, médio e longo prazo sobre políticas públicas essenciais. O saneamento básico é uma dessas políticas – e talvez a que mais exige estabilidade, planejamento e visão de futuro.

Nesse contexto, a discussão sobre o futuro da Copasa torna-se central. A companhia atende mais de 600 dos 853 municípios mineiros e, por isso, sua trajetória impacta diretamente a vida de milhões de mineiros. Qualquer que seja o modelo adotado – público, privado ou misto –, cabe ao Estado garantir que o saneamento seja tratado como serviço público essencial, pautado em planejamento de longo prazo, estabilidade institucional, capacidade de investimento para universalização e tarifas socialmente acessíveis.

Mais do que isso: qualquer decisão precisa assegurar que os recursos envolvidos permaneçam vinculados ao setor, destinados a ampliar o acesso e promover a qualidade ambiental. É inaceitável que qualquer movimentação feita resulte em descontinuidade de investimentos ou em retrocessos no cumprimento das metas de universalização.

É hora de construir um pacto pelo saneamento em Minas Gerais, capaz de reunir Executivo, Legislativo, Judiciário, órgãos de controle, sociedade civil, especialistas, trabalhadores do setor e os próprios municípios. Esse pacto deve se orientar pela busca das convergências, reconhecendo que, embora haja divergências legítimas quanto a modelos e caminhos, todos compartilham do mesmo objetivo: garantir acesso a serviços de qualidade para toda a população. Somente um processo amplo, participativo e responsável permitirá que as diferenças sejam superadas em favor de consensos duradouros, assegurando que as decisões tomadas hoje consolidem um serviço universal, de qualidade e sustentável para as próximas gerações.

Saneamento não é moeda de troca. É direito, é saúde, é dignidade. E deve ser tratado como prioridade máxima de Estado.

 Publicado no Jornal O Tempo em 5 de novembro de 2025.

Foto Cristiano Trade