Ensaios de Toxicidade em Efluentes Industriais - Resolução CONAMA 430/11



A Gestão dos Recursos Hídricos é uma ferramenta que vem sendo executada em diversas regiões do Brasil, principalmente após a publicação da Lei das Águas (Lei 9.433/07). Conforme a lei federal, um dos instrumentos previstos para aplicação é o enquadramento dos corpos hídricos em classes de uso preponderante, porém para isso ocorrer é necessário ter um conjunto de dados sobre a qualidade hídrica dos corpos de água em questão. Para isso são efetuadas diversas análises físicas e químicas, no entanto estas nem sempre representam a real condição do recurso hídrico. Portanto, os testes ecotoxicológicos são considerados como uma análise importante no planejamento dos recursos hídricos, pois conseguem representar a real condição do meio ambiente, ou seja, a qualidade em que o ecossistema analisado se encontra. Contudo, as legislações nacionais ainda estão abaixo da utilização desse tipo de análise e apenas citam como uma forma de complementação dos ensaios de qualidade hídrica. Por mais que vários países utilizem esse tipo de metodologia para avaliar os impactos ambientais, nós ainda temos muito que evoluir nessa questão.

 

 

 

O monitoramento da qualidade da água é uma ferramenta imprescindível no gerenciamento dos recursos hídricos, pois acompanha a evolução das ações humanas e a qualidade dos ambientes aquáticos. Esse instrumento oferece importantes respostas para os sistemas de gestão no que diz respeito às tomadas de decisões, objetivando o controle e a proteção dos recursos hídricos. Com base na Lei 9433/97, Política Nacional dos Recursos Hídricos, que norteia as diretrizes para a gestão dos recursos hídricos no Brasil, foram estabelecidos alguns instrumentos de gestão. Um dos principais instrumentos de planejamento relacionados a garantir a disponibilidade qualitativa de água é o enquadramento dos corpos hídricos em classes, segundo seus usos preponderantes. Porém a ideia de enquadrar os corpos hídricos em classes é anterior a lei nacional. A gestão da qualidade das águas teve seu primeiro instrumento nacional publicado em 18 de junho de 1986, a Resolução CONAMA 020. Esta Resolução trouxe a primeira divisão das águas superficiais em classes, os parâmetros físicos e químicos necessários para o seu enquadramento e também as limitações de substâncias para os lançamentos de efluentes. Devido a isso, de certa forma, foram “desconsiderados” os pesquisadores que naquela ocasião já apoiavam, baseados nas experiências de outros países, a introdução dos testes ecotoxicológicos.

 

Com o passar dos anos foi constatado que a resolução n° 20 do CONAMA continha diversas incoerências com relação aos padrões de qualidade, sendo alguns considerados muito restritivos para ser analisados com a capacidade tecnológica de controle da poluição existente no país e outros muito permissivos perante a qualidade ambiental requerida. Deste modo esta resolução foi substituída, em 17 de março de 2005, pela resolução n° 357 do CONAMA, que teve algumas alterações significativas no que diz respeito a qualidade dos corpos de água. Foram estipulados princípios mais protetores de qualidade hídrica; inclusão dos princípios de função ecológica da propriedade, da prevenção e precaução, além da necessidade de se manter o equilíbrio ecológico aquático; e alterou-se o número possível de classes para o enquadramento dos rios. As maiores alterações na Resolução se deram em relação aos padrões de qualidade química, com adição de 19 parâmetros, além da flexibilização e aumento da exigência de alguns em específico. Além dos padrões de qualidade da água, outra importante e esperada mudança realizada foi à exigibilidade de bioensaios ou testes de toxicidade para se investigar as interações entre as possíveis substâncias químicas presentes no meio aquático, como é salientado no seguinte trecho da resolução: “as possíveis interações entre as substancias e a presença de contaminantes não listados, passiveis de causar danos aos seres vivos, deverão ser investigadas utilizando-se ensaios ecotoxicológicos, toxicológicos, ou outros métodos cientificamente reconhecidos” (artigo 8°, §4°). Esta resolução complementa ainda que no caso de lançamento de efluentes líquidos industriais provenientes de indústrias químicas, petroquímicas e siderúrgicas, poderão ser estabelecidas exigências adicionais para cada caso específico, em termos de toxicidade crônica. Mesmo tendo a presença dos ensaios ecotoxicológicos, ainda sim a resolução determina que os órgãos ambientais estaduais serão responsáveis pela indicação da realização ou não destes testes. Esse fato ainda deixa as análises ecotoxicológicas como um fator de não obrigatoriedade em qualquer que for a condição ambiental, sendo apenas para ser usado em casos que já se espera uma toxicidade no efluente ou ambiente. Outras resoluções do CONAMA também apontam para a realização de testes de ecotoxicologia, como é o caso do CONAMA 430/11, que é uma alteração/complementação do CONAMA 357/05 com relação aos efluentes líquidos, o qual atesta em seu artigo 18 que “O efluente não deverá causar ou possuir potencial para causar efeitos tóxicos aos organismos aquáticos no corpo receptor, de acordo com os critérios de ecotoxicidade estabelecidos pelo órgão ambiental competente”. Isto fez com que os estados no Brasil, que ainda não possuíam critérios ecotoxicológicos, pudessem avaliar a qualidade dos efluentes. As resoluções CONAMA 344/04 e 393/07, também trazem à tona a importância da execução dos ensaios ecotoxicológicos. Estas resoluções do CONAMA são legislações federais e por isso autorizam a formulação de leis estaduais ou municipais mais restritas, de acordo com a necessidade estadual ou municipal, ficando livres para estabelecerem seus próprios limites de toxicidade. No Brasil a Companhia Estadual de Tecnologia Ambiental (CETESB-SP), a Fundação de Meio Ambiente de Santa Catarina (FATMA-SC), a Fundação Estadual de Engenharia e Meio Ambiente (FEEMA-RJ), a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM–RS), o Instituto Ambiental do Paraná (IAP– PR) e a Companhia Pernambucana de Meio Ambiente (CPRH-PE) recomendam a realização de análises de toxicidade com utilização de organismos padronizados internacionalmente, como um importante instrumento para a avaliação do impacto gerado por substâncias químicas ou efluentes lançados. No caso do estado do Paraná, no ano de 2010 foi publicada a resolução CEMA 081, que dispõe sobre critérios e padrões de ecotoxicidade para o controle de efluentes líquidos lançados em águas superficiais no presente Estado. Em seu primeiro artigo a resolução trata sobre “Fixar critérios e padrões de emissão relativos a ecotoxicidade de efluentes líquidos para as fontes geradoras que lancem seus efluentes em águas doces, salinas e salobras no estado do Paraná, para fins de licenciamento e automonitoramento exigido pelo órgão ambiental competente e Instituto das Águas do Paraná na outorga e cobrança sobre o lançamento de efluentes”. Essa resolução atribui fatores de toxicidade aos efluentes e impõe limites a cada tipo de indústria geradora de efluentes tóxicos, possibilitando a melhoria gradual da qualidade do efluente lançado. Outro fator destoante da legislação estadual para as legislações federais é a imposição do tipo de análise ecotoxicológica que cada segmento industrial deve fazer, ou seja, que organismo dever ser utilizado para realização das análises. Este tipo de imposição de análise é importante em um planejamento de gestão hídrica em uma bacia hidrográfica, pois com a padronização das análises é possível comparar os resultados obtidos e assim escolher qual o melhor uso para determinado corpo aquático. A falta de padronização das análises ecotoxicológicas mostrada pelas resoluções do CONAMA é um fator de enfraquecimento na utilização dos testes de toxicidade. Um gestor de recursos hídricos deve ter como equiparar os resultados qualitativos de áreas distintas para poder tomar a melhor decisão.

 

Ensaios de Toxicidade

 

Os ensaios toxicológicos possibilitam detectar a toxicidade da amostra como um todo, avaliando os efeitos combinados dos diferentes constituintes da amostra, enquanto a análise química permite apenas quantificar as substâncias isoladas presentes numa amostra. A análise ecotoxicológica mede o tempo e os efeitos de diferentes concentrações de uma amostra em indivíduos de uma determinada espécie. Estes testes podem ser agudos ou crônicos, dependendo de sua duração e do efeito observado.

 

Toxicidade aguda é o efeito deletério aos organismos vivo causado por agentes físicos ou químicos, frequentemente letalidade ou alguma outra manifestação que a antecede, em um curto período de exposição. O período de exposição dos testes é, em geral, de 24 a 96 horas, e o resultado é expresso através da CE50 (concentração efetiva inicial mediana), CL50 (concentração letal inicial mediana) ou FT (fator de toxicidade).

 

Toxicidade crônica é o efeito deletério aos organismos vivo causado por agentes físicos ou químicos que afetam uma ou várias funções biológicas dos organismos, tais como a reprodução, o crescimento e o comportamento, em um período de exposição que pode abranger a totalidade do seu ciclo de vida ou parte dele.

 

Organismo-teste são indivíduos padronizados e cultivados em laboratório, que podem fornecer indicações sobre as condições de um ecossistema frente à presença de impacto ambiental.

 

Mesmo após uma década da publicação da CONAMA 357 a dificuldade da compreensão dos ensaios de toxicidade ainda é uma realidade, tanto para os órgãos de fiscalização ambientais quanto para aqueles que necessitam monitorar seus efluentes. Os questionamentos sobre a interpretação dos resultados dos ensaios ou do atendimento as exigências das resoluções são frequentes.

 

Os estudos para redução de toxicidade de efluentes devem estar baseados na busca de alternativas na fonte geradora, necessitando de conhecimento específico da empresa e dos processos envolvidos, bem como matérias-primas e insumos utilizados. As soluções disponíveis não são idênticas para empresas do mesmo setor, apenas semelhantes, visto que pequenas alterações podem acarretar em significativas mudanças nas características dos efluentes, principalmente em relação à toxicidade. Em vista disto, evidencia-se a importância da atuação de um profissional especializado da área, em conjunto com a empresa.

27-11-2015