Sobrou para a natureza

Brasília - Dezesseis dias depois da identificação do vazamento em um poço de extração de petróleo no Campo de Frade, localizado a 370 quilômetros da costa fluminense, representantes da petroleira norte-americana Chevron tiveram de se explicar ontem ao ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. O presidente da empresa para África e América do Sul, Ali Moshiri, classificou a fissura como "incidente" e tentou isentar a petrolífera de responsabilidade na tragédia natural. A culpa, para ele, é da "geologia complexa" da área. "Lidamos com a mãe natureza e a mãe natureza é complicada", argumentou Moshiri.

O vazamento no Campo de Frade já estaria "sob controle", de acordo com o presidente da Chevron e a mancha de óleo no mar "praticamente desapareceu" - a vedação completa do poço onde houve o acidente demorará mais 20 dias. "Estamos de volta às operações normais", afirmou Moshiri, em referência aos procedimentos de selar e abandonar o poço onde houve o acidente. A fala confronta a decisão da diretoria da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

A entidade suspendeu as atividades de perfuração na Bacia de Campos "até que sejam identificadas as causas e os responsáveis pelo vazamento de petróleo e restabelecidas as condições de segurança na área". Em relação a essa decisão, o presidente informou que a empresa já se preparava para interromper a perfuração no campo para tentar entender melhor a geologia do local. "Não estamos planejando retomar a perfuração até que a gente entenda completamente a situação", disse Moshiri. A ANP ainda rejeitou pedido da concessionária para perfurar novo poço no campo para atingir a camada do pré-sal.

PERMISSÕES O ministro de Minas e Energia lembrou que a petroleira poderá continuar operando os outros 11 poços que possui no Campo de Frade. Isso porque a decisão da ANP suspenderia apenas a perfuração de novos poços. "Até que a ANP conclua suas investigações e possa modificar suas determinações, a Chevron continuará impedida de perfurar novos poços. Mas continuará operando os poços que já possui", disse. Ainda segundo Lobão, os executivos não fizeram nenhum apelo para que o governo reveja punições contra a empresa - a Chevron pode ter de pagar R$ 260 milhões em multas do Ibama (R$ 60 milhões), da ANP (R$ 100 milhões) e da Procuradoria Geral do Rio de Janeiro (R$ 100 milhões). As multas foram exigidas ou anunciadas.

A Petrobras ainda poderá ser obrigada a arcar com 30% do total de multas e indenizações que a americana Chevron tiver de pagar - o percentual se refere à participação da estatal no campo. Caso as investigações apontem negligência ou erro operacional da Chevron, o valor deverá ser pago apenas pela petroleira americana.

O secretário de Estado do Ambiente do Rio de Janeiro, Carlos Minc, disse ontem que estudos prévios realizados pelo governo estadual indicam que o vazamento poderia ter sido evitado. "Embora a empresa culpe a alta pressão exercida pelo óleo durante a extração, há estudos indicando que a Chevron poderia ter se preparado a fim de prever e evitar essa situação", disse, em audiência pública na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

A Polícia Federal, que já abriu inquérito para apurar o vazamento, deve tomar depoimentos hoje de quatro executivos de alto escalão da Chevron. Eles devem ser ouvidos pelo delegado federal Fábio Scliar, responsável pelas investigações. Outros funcionários diretamente ligados à operação da plataforma darão informações ao longo da próxima semana. Entre as possíveis causas do vazamento, estão o erro de cálculo na perfuração, um procedimento além do previsto e a utilização de equipamentos inadequados na operação.